Entrevista: Carlos Alberto Grana O presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT conversou com o VOX sobre crise financeira, 1º de Maio e Lula, o metalúrgico que se tornou presidente

Carlos Alberto Grana O presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT ministrou uma palestra exclusiva aos alunos do Cursinho da Poli

Carlos Alberto Grana é presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT (CNM/CUT). No dia 14 de maio de 2009, ministrou no Cursinho da Poli uma palestra sobre a crise financeira mundial e como ela afetou o setor metalúrgico, que concentra uma parte significativa da força de trabalho do país.

Engajado politicamente desde cedo, Grana se tornou sindicalista aos 18 anos, participou da fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), e já ocupou os cargos de diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André, de secretário geral do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, de presidente da Federação Estadual dos Metalúrgicos da CUT e de secretário da CUT Nacional. Mas sua primeira ação política aconteceu aos 16 anos, num grupo de jovens que, sob orientação do padre Rubens Chasseraux, promoveu uma peça de teatro cujo tema era o direito à moradia.

Confira abaixo a entrevista exclusiva ao VOX:

Aos 18 anos, o senhor já estava engajado no movimento sindical. Os jovens, hoje, em sua grande maioria, estão menos interessados nos movimentos políticos e sociais?

Este é o grande desafio do movimento sindical no Brasil: o distanciamento, o desinteresse da juventude, que está com outros valores, foi formada num outro período e não valoriza as conquistas do movimento sindical, nem a política de um modo geral. Ela já cresceu numa situação diferente, por isso não a valoriza. Acho que o desafio do sindicato é exatamente este, conscientizar o jovem de que, quando ele chega a uma empresa hoje, em melhores condições de trabalho, melhores condições de salário, melhores direitos, isso é resultado de uma conquista. Hoje, o jovem não valoriza essas coisas porque acha que é algo que já estava lá, que sempre foi assim. E não foi.

Apesar de tantas conquistas, o sindicato ainda é visto de forma preconceituosa por muitas pessoas. Por quê?

Primeiro, é preciso contextualizar o momento histórico: o sindicalismo tem desempenhado um papel de relevância no país não só na economia, mas na política. Não dá para desassociar a luta dos metalúrgicos no final da década de 1970 da luta pela abertura política. Todo esse ambiente democrático no Brasil teve seus reflexos no movimento sindical e nas relações de trabalho. Era uma luta reivindicatória, havia repressão, era violento. Naquele período, a mídia estava comprometida com o governo – a ditadura – e com o empresariado. Hoje, menos com o governo; mas continua comprometida com o empresariado: quem são os grandes anunciantes? Então, interessa a eles criar essa imagem dos sindicatos, uma imagem preconceituosa que foi constituída ao longo dos anos, e vai levar algum tempo para apagá-la efetivamente. Mas isso vem melhorando significativamente, mesmo porque muitas pessoas foram beneficiadas com os avanços e com as conquistas que os próprios sindicatos proporcionaram.

E quais são as diferenças entre as dificuldades enfrentadas pelos sindicatos no período da ditadura e atualmente?

No passado, a gente tinha que fazer greve para ter o direito de ser ouvido – não era nem para fazer reivindicação, era para poder ser recebido pelos diretores das empresas. Hoje a negociação é permanente, quase diária. Porém, também é difícil, porque exige do dirigente sindical um preparo, uma capacitação e um alto grau de conhecimento, pois as empresas capacitaram seus interlocutores para negociar com o sindicato. A economia está internacionalizada, as empresas são multinacionais e, portanto, muitas decisões não são tomadas aqui, mas nos seus países de origem, na Alemanha, nos EUA, na França... Antigamente, um dirigente sindical aprendia a fazer um bom discurso, xingava o dono da empresa e já estava bom. Hoje, não: muitas vezes ele tem que falar inglês, alemão, para poder se comunicar.

O Dia do Trabalhador (1º de maio) é o símbolo das lutas dos trabalhadores por seus direitos e melhores condições de trabalho. Quais são, atualmente, as principais lutas dos sindicatos?

Carlos Alberto Grana Grana se tornou sindicalista aos 18 anos, mas sua primeira ação política foi aos 16, quando participou de uma peça de teatro cujo tema era o direito à moradia

Hoje as principais lutas dos trabalhadores são a preservação dos empregos e a garantia do aumento real de salários. Vivemos os efeitos da política neoliberal e o desmonte do Estado com um processo de privatizações que dilapidou o patrimônio dos brasileiros e limitou a ação do Estado sobre a economia. Nossa luta constante da década de 1990 até o ano de 2002 era de resistência às demissões e à inflação alta com corrosão do poder de compra dos salários, e pela consequente necessidade de recompor os salários. A partir de 2003, a conjuntura econômica brasileira mudou, e conseguimos uma efetiva melhoria nos níveis de emprego, salário e na PLR, a Participação nos Lucros e Resultados. Hoje, diante da crise da economia globalizada, nossa luta é por manter os empregos e continuar a conquistar os aumentos reais de salários, girando a economia e aumentando a produção. É um ciclo virtuoso que acaba beneficiando o país.

As grandes companhias automobilísticas foram bastante afetadas pela crise financeira mundial: a Chrysler anunciou concordata, a Fiat e a GM confirmaram uma fusão, há demissões em massa... Como estão reagindo a CNM/CUT e os demais sindicatos? Quais são as propostas para impedir ou, pelo menos, diminuir o impacto das medidas das grandes companhias?

Desde o início da crise no Brasil, nossos sindicatos e a CNM/CUT iniciaram um processo de luta e resistência, realizando inúmeros atos e greves contra as demissões e propondo acordos como o firmado com a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ). A novidade neste caso é a chance de participação efetiva dos governos estaduais, somados ao Governo Federal e ao BNDES, desonerando temporariamente impostos como PIS, Cofins, IPI e ICMS para estimular a retomada dos investimentos e para aquecer a economia de forma mais rápida. Trata-se apenas de um ajuste de fluxo de caixa, pois é fundamental uma redução de preços para promover a liquidez no setor. É uma questão de inteligência.

Ainda que a crise tenha chegado ao Brasil mais forte do que a “marolinha” prevista pelo presidente, é preciso considerar que nossa economia conseguiu se blindar de grandes prejuízos, se comparada à de outras grandes nações. Quais são as perspectivas positivas nesse sentido, do ponto de vista da CNM/CUT?

O receituário neoliberal, com novas formas contratuais, desregulamentação e diminuição do papel do Estado na gestão da economia, levou os países centrais a uma aventura sem precedentes na economia mundial, um verdadeiro tsunami. No Brasil e em boa parte da América Latina, optou-se por um modelo diferente, um Estado mais atuante e presente. Os fundamentos da economia brasileira oferecem uma relativa blindagem ao país.

O que representa para a CNM/CUT e para a classe metalúrgica o fato de que Lula, que já trabalhou como torneiro mecânico, tenha alcançado a Presidência da República?

Representa uma inversão na lógica neoliberal de diminuição do papel do Estado. Conseguimos, pela primeira vez em mais de 500 anos de história, transformar a classe trabalhadora em protagonista de sua história. Lula, um ex-torneiro mecânico, vindo para São Paulo fugido da seca e da miséria que sempre assolou o nosso querido Nordeste brasileiro, é um trabalhador que ousou enfrentar junto com tantos outros a ditadura militar, ousou criar um partido de trabalhadores, ousou sonhar e – com esse sonho de toda uma geração – realizar uma das mais belas experiências de organização da classe trabalhadora.

Lula implementa uma poderosa política de proteção social e distribuição de renda. Não governa sozinho: depende de uma base de sustentação no Congresso, onde os partidos de esquerda são minoria e é necessário compor alianças com setores conservadores para ter-se um mínimo de governabilidade. Importa frisar que o vice-presidente José Alencar é um poderoso empresário nacional. O futuro ainda é incerto, mas as experiências desses trabalhadores e trabalhadoras lutando por um país melhor ficam de fato para sempre como um sonho de ousadia, acertos e erros, fé, esperança e a certeza  de que todos temos potencial de vencer. E melhor, de vencermos juntos!

As informações contidas nas respostas do entrevistado não traduzem necessariamente a opinião do Vox. topo

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Redação: Leonardo Vinícius Jorge - Design: Brasil Multimídia
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