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O professor Antonio Marcos de Aguirra Massola é diretor da Escola Politécnica da
USP. Durante sua gestão à frente da Poli, tem incentivado e colaborado com o projeto
do Cursinho. Além de ser um incentivador, Massola dá idéias e propõe
desafios. Nesta entrevista, ele aborda não só o Cursinho da Poli,
mas também o compromisso social da Universidade e o papel que o cidadão
deve ter no sentido de transformar a realidade em que vive.
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Como o senhor imagina que o Cursinho da Poli, enquanto um projeto de extensão da USP, pode desenvolver
parcerias para ampliar sua interação com a sociedade?
A melhor parceria que o Cursinho da Poli pode fazer com a sociedade está na disponibilização
das informações que tem produzido. Informações que uma grande parte da sociedade
não consegue ter de forma objetiva e racional. Para isso, é preciso fazer publicações
do Cursinho que cheguem às escolas secundárias e atinjam alunos que não têm recursos
financeiros para freqüentar um cursinho comercial. Parcerias com o Estado e a iniciativa privada, se
viabilizadas, podem auxiliar na elaboração desse documento. O Cursinho já tem uma
produção de qualidade e é importante que isso chegue a uma quantidade maior de pessoas
da nossa população.
Isso iria eliminar o que chamamos de terror cultural, que é a marginalização de um grande
número de pessoas do acesso à cultura. |
De que forma a Universidade poderia se aproximar mais da sociedade, colaborando para seu desenvolvimento do
ponto de vista de políticas públicas?
A Universidade tem um potencial de conhecimento extremamente elevado. Por ser pública e gratuita, ela tem
de oferecer, todos os seus conhecimentos. O Cursinho já faz isso. Ele tem uma série de projetos
de apelo comunitário. É esse tipo de ação que temos de aumentar, porque a nossa
Universidade pode oferecer muito mais.
Falando em o que a Universidade oferece, algo que interessa muito ao aluno do Cursinho é a quantidade de
vagas oferecidas nas universidades públicas. Há muito tempo esse número não cresce e,
assim, só aumenta a quantidade de pessoas que ficam fora das universidades. O senhor vê alguma
saída para o problema? Como seria possível ampliar a oferta de vagas?
De alguma forma as universidades estão ampliado a oferta de vagas, mas não é possível
aumentá-las de uma hora para a outra. Isso tem de ser trabalhado. Há problemas com docentes,
funcionários e recursos para montar laboratórios. Em alguns cursos eles podem ser solucionados
sem muitos gastos. Em outros isso custa muito, pois são caros, como Engenharia, Odontologia e Medicina.
O que se deve fazer é verificar efetivamente, área a área, quais são as nossas
necessidades e tentar cobri-las com atividades já existentes, colocando-as à
disposição da população. Mas isso tem de ser muito bem estudado.
Não
podemos criar uma universidade sem que ela tenha recursos para sobreviver. Hoje temos três universidades
públicas e gratuitas no Estado e, além disso, temos as Fatecs. O que precisaríamos pensar
é como racionalizar os recursos enviados a elas, do ponto de vista de aumento de vagas em cada uma.
É um problema, se levarmos em conta que os nossos recursos já estão alocados. Algumas
universidades já trabalharam no sentido de disponibilizar mais recursos com bases em suas atividades,
criando outros cursos, multiplicando o número de aulas de seus docentes. Só isso, porém,
não basta. É necessário fazer um levantamento real do que temos no nosso Estado.
Soluções existem. Elas podem ser ousadas e inovadoras. O problema é ter vontade e ousadia
para enfrentar questões como essa.
O senhor não considera o Cursinho da Poli um exemplo de solução?
É um mecanismo. O Cursinho com seus mais de 8 mil alunos mostra que a iniciativa e a vontade de fazer
funcionam. As soluções vão nessa linha de raciocínio. Agora, quando você faz isso,
não pode pensar só politicamente. Você tem de pensar do ponto de vista social e do impacto de
cursos em diferentes áreas.
Se os governos apoiassem iniciativas como essa do Cursinho da Poli, o senhor não acha que já
estariam praticando uma ação nesse sentido?
Há uma série de coisas que os governos podem fazer para o Cursinho da Poli. Eles podem, por exemplo,
patrocinar certas atividades. O caso da Febem, em que se tentou fazer uma parceria, é um exemplo.
Acredito que a iniciativa pública pode fazer um monte de coisas, mas é tarefa nossa
conscientizá-la de que ação gera resultados. Precisamos dizer: "Fizemos e olhe aí como
deu certo. Agora vocês não querem contribuir com a gente?".
O Cursinho poderia tornar-se muito mais
produtivo, muito mais empreendedor se tivesse apoio. Acho que o pessoal do Cursinho não quer dinheiro,
quer apoio. Quer, por exemplo, que o Estado dê um prédio. Podemos reformá-lo e fazer o Cursinho.
Há várias iniciativas, não só do governo do Estado, mas da Prefeitura, como a de levar
essa idéia para outras regiões.
O senhor não avalia que os poderes públicos se distanciaram demais da Universidade e vice-versa?
Sim. Acontece que, quando os governos estabelecidos não vêm procurar na Universidade a solução
de seus possíveis problemas, cria-se esse distanciamento. O exemplo típico é quando há um
problema que a Universidade tem potencial de atender, mas o governo prefere contratar empresas, pagando o desenvolvimento a
custos elevados sem ter a melhor solução. Esse distanciamento existe e temos de trabalhar para
encurtá-lo.
Com isso, certamente, ampliaremos nosso respeito e credibilidade junto à sociedade.
Mas isso demanda mudanças de cultura e mentalidade de nossos políticos, o que não é
fácil de fazer da noite para o dia.
Na entrevista realizada para a revista de 1999, o senhor disse que, quando o aluno sente necessidade de colaborar,
o professor e o funcionário se envolvem nos projetos e que, se a iniciativa partisse dos professores e
funcionários, ela ganharia uma força maior...
Claro, é isso mesmo. Hoje estamos vendo que as iniciativas dos Centros Acadêmicos voltados para o interesse
comunitário estão polarizando os próprios docentes de uma maneira geral. O interessante é que
somos procurados pelos docentes que querem fazer alguma coisa do ponto de vista social. Hoje mesmo apareceram dois querendo
ajudar: "Podemos contribuir muito mais". É gozado isso. Será que não temos condições de
melhorar a situação das pessoas que estão presas? Será que não estamos falhando nisso e
estejamos cobrando só do governo?
Acho que temos uma significativa contribuição a dar para melhorar a
qualidade de vida da população. Mas isso não é só o docente, o funcionário e o
aluno da USP. Toda a nossa sociedade tem de se mobilizar no sentido de transformar a sociedade. Isso passa também
pelo aluno do Cursinho da Poli.
O senhor falou dos presidiários e sabe que o Cursinho tem um convênio com a Funap. Entramos, então, em
um campo que poderíamos dividir entre excluídos e excluidíssimos...
Sem dúvida, os presos são os excluidíssimos.
Para eles não há programas, não só da Universidade, como de nenhum lugar.
É verdade. Quando o camarada sai de uma prisão, é jogado na rua e passa a ter de enfrentar os
problemas que surgirem sem nenhuma preparação. Isso volta para a própria sociedade como
violência. Considero muito positivo esse convênio que o Cursinho fez com a Funap e acho que ele deve ser
avaliado para que se discuta a possibilidade de ampliação para outros setores de excluidíssimos,
como você denominou.
Essa tarefa também está colocada para a Universidade ou não?
Os problemas da sociedade dizem respeito a todos os que fazem parte dela. Mas há uma questão cultural de
difícil solução, até mesmo na Universidade. É preciso chamar o indivíduo para
transformar a situação.
Imaginando que o senhor fosse um estudante do Cursinho da Poli que não tivesse condições de pagar
uma faculdade.
E, ao final do Cursinho, não conseguisse a sonhada vaga em uma universidade pública, como o
senhor acha que um estudante deve se comportar, já que não há vagas para todos?
Deveríamos ter mais cursos profissionalizantes.
Numa época em que existiam esses cursos havia possibilidade
de o aluno ter uma profissão, desenvolver sua vocação. Percebemos que, hoje, se o camarada não
tem um título de nível superior, ele não consegue um emprego. Mas, na verdade, título, às
vezes, não resolve problema de ninguém. O importante é que ele tenha capacitação para
desenvolver atividades, mesmo profissionalmente, sem ter nível superior.
O que deveria ser enfatizado é
a necessidade de escolas técnicas no nível do ensino médio, para que tenhamos a experiência do
Cursinho multiplicada. É preciso ter claro também que o contato com a cultura que os estudantes do Cursinho
têm também é fundamental, porque a vida não se traduz apenas no objetivo de ter uma
profissão. O indivíduo tem de ser formado em todas essas diferentes formas de atividades que ele vai encontrar.
Cultura é absolutamente importante na formação do cidadão. |
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